Nem bem acabou a correria de final de ano e eis que surge um grito na avenida: “olha o carnaval aí, gente!”. O zum, zum, zum é grande. É tempo de alegria, de uma brincadeira que é levada a sério por muitas pessoas que trabalham freneticamente para que os desfiles das escolas de samba sejam impecáveis.
Até quarta-feira de cinzas, o carnavalesco empresta o corpo para vestir uma fantasia dentre as disponíveis para o desfile daquele ano. O samba, as fantasias, a purpurina, a serpentina, a divisão das pessoas em alas levam-nos a pensar. Como cada um se inscreve no desejo do Outro? Como cada qual vem compondo o samba-enredo de sua vida? Que tipo de fantasia anda vestindo?
Há quem se esconda por trás de fantasias imaginárias. É como se dissessem para si mesmas que, sem a fantasia de “bom moço” ou de “rebelde”, por exemplo, não conseguiriam entrar na avenida. Outras seguem o fluxo do bloco de rua, cantando um samba-enredo sem ater-se à letra, apenas a vozeando.
A fantasia sempre teve um papel fundamental na teoria e história da psicanálise. A partir das histéricas, Freud se deparou com a distinção entre realidade empírica e realidade psíquica. Fantasia, para a psicanálise, é uma ficção que dá estrutura de verdade a um fato.
Assim sendo, ao longo de uma análise, não se trata de decretar o fim do trio Pierrô, Colombina e Arlequim. Mas, trata-se de aprender a ver em que medida uma determinada fantasia serve ou não para sua vida.
Em uma análise, muitas vezes é necessário rasgar algumas fantasias para que outras sejam construídas. Uma análise, portanto, é um convite para que essa fantasia estrutural do sujeito possa ser enunciada e atravessada. Muitas vezes, a pessoa descobre que está desfilando em uma ala que não condiz com seu desejo.
Opa! É quando o analista ouve o “Ó abre alas, que eu quero passar”! A pessoa, então, é convidada a construir o seu samba-enredo, longe das expectativas de aplausos de outros blocos. O samba-enredo, que dará o ritmo, e a fantasia, que dará o colorido, não se acabarão na quarta-feira. Perdurarão até quando a pessoa quiser colocá-los na passarela da vida…