Luciana e Rogério procuram a psicanalista preocupados com sua filha, de nove anos, Talita. Ela não conseguia se alfabetizar. Tinha sido diagnosticada como uma criança com déficit de atenção. Há dois anos, vinha sendo atendida por psicopedagogos e outros profissionais da saúde, mas nada dava jeito. “O que mais podemos fazer, doutora, a psicanálise pode ajudar nossa filha? ”
Talita era uma criança muito amorosa. Adorava brincar com o irmão mais novo e não media esforços para estudar e fazer as atividades da escola. Tentava ler e escrever, mas tinha dificuldade de entender o que lia. Sofria muito porque, apesar de sua dedicação, suas notas não melhoravam. Aliás, só pioravam. Parecia viver no “mundo da lua” e se isolava cada dia mais. Inicialmente, os pais acharam que era timidez, mas a menina foi ficando angustiada e irritada.
A psicanalista pediu detalhamento. O pai lembrou que, às vezes, ao ouvir a menina cantar, percebia trocas de palavras. Por exemplo, ao invés de cantar “atirei o pau no gato”, a criança cantava “atirei o pau no pato”. À época, os pais não deram atenção para isso, porque achavam que acontecia com todo mundo. Foi combinado que Talita viria para uma entrevista.
No primeiro encontro com a menina, ela contou como se sentia perdida na escola. Sempre prestava muita atenção quando a professora falava, tentava copiar, ler e escrever tudo certinho, mas sempre errava alguma coisa. A pior atividade era o ditado. A psicanalista perguntou se ela tinha medo de ser reprovada. Enquanto fazia a pergunta, reparou que a menina não olhava seus olhos, mas, sim, seus lábios. Era hora de levar a sério o conselho de Freud: “não subestimemos, pois, os pequenos indícios, a partir deles, talvez seja possível encontrar a pista de coisa maior” (Primeira Conferência Introdutória, 1915, p. 34). A aposta da analista foi orientar os pais a procurarem um otorrino e não prosseguir a análise de Talita.
O exame de audiometria da menina mostrou que Talita tinha um problema genético de perda de audição do ouvido esquerdo. Não escutando bem, ela se virava como podia. Seu caso não era de déficit de atenção e nem de psicanálise. Por dois anos, Talita não ouvia e não estava sendo ouvida. Angustiados, os pais estavam insistindo em tratamentos que não estavam funcionando para aquela criança.
Muitas vezes ansiosos para resolverem rapidamente os problemas dos filhos, os pais acabam se pautando em diagnósticos estigmatizados, sem, contudo, os colocarem à prova quando se trata do seu filho. Se, por um lado, tais diagnósticos acalmam os pais, pois nomeiam um sofrimento, por outro, criam um obstáculo. Mascaram o problema, perpetuando o sofrimento de todos. Para a surdez de Talita, foi indicado um otorrinolaringologista. Para a surdez dos pais, uma psicanálise.
Muito interessante esse relato. Os pais, atualmente, estão muito ansiosos com o sucesso dos filhos e isso os leva a avaliá-los a partir de um lugar comum, um diagnóstico pré-fabricado. A psicanálise, sem dúvida, pode ajudá-los.
Oi Anna, sim, com certeza uma psicanálise pode trazer várias transformações significativas na vida de uma família. Sigamos e espero seus comentários nos próximos textos.