“A mágica lenta” (“La magie lente”, Denis Lachaud/Pierre Notte) é o título de uma peça que esteve em cartaz na França, em 2019. A obra foi inspirada em uma frase de Freud, no texto “A questão da análise leiga: diálogo com um interlocutor imparcial” (1926), no qual Freud associa “psicanálise” e “mágica”. Chamou-nos a atenção o título da peça que, aparentemente, é contraditório. Uma mágica pode ser lenta? Como? Por quê?
A palavra mágica pode adquirir tantos significados e funcionar em tantos contextos que é preciso examiná-la mais de perto. É recorrente em nossas vidas: “isto é mágico”, “parece mágica” e por aí vai. Muitas vezes, inclusive, ouvimos pacientes dizerem, frente a alguma situação muito difícil, “só uma mágica para virar este jogo”.
Mágica, ou magia, vem do latim, magus. Ao longo dos tempos, foi associada a feitiçaria, adivinhação, e a magia, a crenças e rituais. Embora as conotações sejam variadas, ao longo da história, o mágico continua a ter um importante papel religioso e medicinal em muitas culturas da atualidade.
E na psicanálise, de qual magia se trata? Qual é a mágica que ela faz? Referindo-se ao tempo de tratamento psicanalítico, que pode durar meses e anos, Freud afirma que “mágica tão lenta perde seu caráter miraculoso”. A mágica rápida, portanto, contraria a psicanálise, posto que o deslumbramento e a ilusão iniciais paulatinamente dão lugar a um trabalho lento e rigoroso.
Ao examinar o texto, parece-nos que Freud estava menos preocupado em escapar do que se convencionou chamar de mágica e mais interessado em estudar porque sintomas tão dolorosos desapareciam.
Quando Freud pontuou a sua “mágica”, ele escapou da sugestão, na medida em que colocou na dor do sintoma o silêncio do que não é dito. Homologando o silêncio às afecções no corpo, a palavra sai do efeito puramente sugestivo e entra no campo discursivo, dando peso e sustentação àquilo de que não se sabe, posto que não se fala! Nesse aspecto, a cura não advirá do além, mas do sujeito que foi buscar junto à análise um sentido para sua vida. E por falar nisso, falar é mágico, mas não é mágica.