Como responder à curiosidade de um paciente frente ao seu analista e à própria psicanálise? As indagações são as mais variadas: Você é casado? Tem filhos? Irmãos? Cachorro? Papagaio? Como é esse negócio de ser psicanalista?
Na década de 1970, era muito comum se dizer que o paciente que muito perguntava acerca do seu analista estava quebrando a moldura do setting e assim até mesmo impedindo e atrapalhando as sessões. Assim, ensinava-se ao analista responder ao paciente com outra pergunta qualquer ou, ainda, a ignorá-lo.
Entendia-se que o analista não pode dar respostas: para uma pergunta, outra pergunta. Ainda hoje, há quem compartilhe dessa visão, segundo a qual a curiosidade do paciente é algo a ser evitado. O analista deveria manter-se na posição do poker face, eximindo-se de uma resposta, para não ceder às tentativas sedutoras do paciente. Era como se pudesse chegar à seguinte conclusão lógica: toda pergunta do paciente acerca do analista teria valor de sedução, logo, entraria no hall das interpretações prontas, das respostas grosseiras-protetivas.
Na tentativa de se manter certa aura em torno do analista, o que se produzia, para alguns sujeitos, era um tremendo mal-estar. Havia, ainda, o risco de um desserviço à psicanálise, com a criação de um imaginário social do psicanalista grosseiro que só abre a boca para dizer: – hum, hum. Terminamos por aqui.
E na clínica de orientação lacaniana? O analista responde ou não responde às perguntas que lhe são feitas? Vale recordar um diálogo travado entre Lacan e sua audiência, na lição de 13 de maio de 1970. Alguém lhe disse: “O que o senhor diz está sempre descentrado em relação ao sentido, o senhor escapa do sentido”. Lacan então responde: “Vai ver que é nisso justamente que meu discurso é um discurso analítico. A estrutura do discurso analítico é assim”. (Seminário XVII, p. 138)
Então, seguindo esta orientação, o analista responde e não responde. Para haver progresso no tratamento, trata-se de descentrar o sujeito em relação ao que ele pensa estar falando no momento da interlocução com seu analista. Às vezes, se achar por bem o fazer, pode redarguir tranquilamente às curiosidades que lhe são dirigidas, desde que, a partir delas, possa introduzir novas ambiguidades. Então, se alguém me pergunta: – “Você tem um gato?” Eu posso responder “Não, eu prefiro os cachorros”, desde que, na sequência, diga algo como: “Mas o que levou você a pensar, logo hoje, nas escolhas que nós fazemos?”.
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